Um Vaso Cheio de Lírios

- Vai trabalhar para a casa dos Infantis, disse ela. Vais ver que vais ver gostar, disse ela. - imitando a voz da tia - Bem, não estou a gostar nem um bocado. Isto é escravatura.

Pontapeou uma folha seca no chão do pátio, enquanto se deslocava para o canteiro seguinte. Como o novo caseiro, uma das suas tarefas, era regar as flores no jardim. Especialmente, os lírios, que estavam na entrada.

Como a patroa tinha dito, enquanto vestia o vison para sair, os lírios recebiam os convidados, mesmo antes de as pessoas o conseguirem fazer.

Estranha mulher... - pensou

Ele tinha estado a manhã toda agachado ou de joelhos, a cavar e a podar, sob o sol escaldante de verão. O suor escorria-lhe pela fronte e a t-shirt estava molhada como se tivesse sido passada por água.

Quando chegou ao canteiro dos lírios suspirou de alívio.

- Ao menos já estou no último. Penso que poderei descansar depois disso.

Ao acabar, sentou-se numa das bordas do canteiro.

- O último mas espero que não seja o menos importante, oh marmelo...

O rapaz levantou-se num salto e procurou pela voz a toda a sua volta.

- Aqui em baixo, onde estavas sentado.

- Um.. um.. um vaso que fala?!

- Um vaso? Mas qual vaso, pá? Onde é que já viste um vaso falar?

Ele olhou para os Lírios e um deles tinha uma folha verde colocado sobre a sua flor. Quase que podia jurar que abanava as suas pétalas, também.

- Isso é só rude...

- É o que é. - disse o Lírio - Experimenta viver uma vida sem conseguires sair do lugar e todas as pessoas que passam se aproximam para cheirar. Com o nariz. Isso é, tipo... na cara. Gostavas de ter caras em cima de ti o dia todo?

- Não. De todo. Muita gente cheira mal da boca...

- Vês? Agora estás a pensar...

A flor rodou ligeiramente para apanhar melhor o sol. O vaso pareceu estremecer um pouco.

- Há algo que te preciso contar antes que a minha voz mensal se esgote. Após o qual voltarei a ser apenas uma flor.

- Só falas uma vez por mês? - disse o rapaz

- Sim, sim, mas isso não é o que importa agora.

- O que é? A tua terra não tem estrume suficiente? Podemos resolver isso...

Um riso falso ecoou do vaso.

- Muito engraçado mas devias mesmo ouvir o que tenho para te dizer...

- Que é? - respondeu o rapaz encostando a cabeça á flor

 - O Barão Infanti matou o seu pai e a sua irmã para ficar com toda a fortuna da família... - confessou o Lírio