Guerra Líquida

...e, por fim, Santarém chega aos 42º de máxima.

O locutor da rádio terminava a emissão da madrugada, com a perspetiva de mais um dia abrasador.

O montado alentejano começava-se a fazer notar enquanto ambos os homens guiavam para mais um dia de trabalho.

Para ele, mais um dia debaixo de sol, a suar, levantando barris. Porém, em casa haviam ficado as suas preocupações. A sua mulher doente precisava do pouco que ele ganhava para sobreviverem nestes tempos difíceis.

No lugar do condutor, o seu colega comia maços de SG Ventil, enquanto cantava, num sotaque bem local o “Living on a Prayer” dos Bon Jovi, que seguira a meteorologia.

Atirou os pés para o tablier, abriu o vidro e sentiu o cheiro a hipericão que a brisa arrastava consigo.

A vida era fácil, naquele momento.

Leve.

Livre.



Fora da janela sentiu uma placa travar o vento.

Os seus olhos abriram de imediato.

- Volta para trás! -  gritou assustado para o seu companheiro – Não devias ter vindo por aqui! Isto é Água Todo o Ano...

- Sim, é. Mas querias o quê...? Que fosse pela Ponte de Sôr?

- Claro! - respondeu, olhando para todo lado – Qualquer condutor de cerveja sabe que isto é uma sentença de morte... Uma quebra de fronteiras destas! - continuou levando uma mão à testa – Dá-me um cigarro desses...

Com a mão cheia de tremeliques acendeu o pequeno cigarro e bafou fundo.

Quando ergueu a cabeça, um rocket rebentou na roda por baixo de si...

Escrito em 02/08/2021

Baseado em factos reais